Poderiam as máquinas pensar tal como os humanos?

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Inauguro com muita honra minha coluna na AINEWS. Sou o Eduardo de Rezende Francisco, cientista da computação, doutor em Administração de Empresas e atualmente chefe do departamento de Tecnologia e Data Science (TDS) da FGV em São Paulo e também sócio-fundador da GisBI, think tank de integração entre Big Data e GeoAnalytics.

Neste primeiro artigo, divido a conversa com meu amigo Gustavo Corrêa Mirapalheta, colega professor do TDS, engenheiro e doutor em Administração de Empresas. Gustavo foi executivo de vendas de software na IBM Brasil e Sun Microsystems, e é um dos maiores especialistas em Deep Learning, Natural Language Processing e Quantum Computing que conheço.

O título provocativo certamente remete os caros leitores a cenas de filmes de ficção científica, no melhor estilo “Exterminador do Futuro”, contexto em que um cientista renomado (normalmente americano) acorda certo dia e tem um insight que o motiva a construir um “chip” ou outro dispositivo que traz, depois, “consciência” (com a definição que a licença poética quiser) para as máquinas. Elas, “sabidas” portanto, passam a subjugar e até escravizar a raça humana. E lá se vão filmes e filmes…

Pois bem, será que veremos o surgimento de máquinas que pensam?

Em toda boa pergunta, há um truque. Esta não foge à regra. Onde está o truque neste caso? Quando ouvimos a pergunta, automaticamente assumimos que as máquinas só podem pensar por meio de algoritmos.

A história recente da humanidade fez surgir um novo personagem que está em alta: a Inteligência Artificial. Existem inúmeras definições e interpretações para esse conceito (conversa para futuros artigos), mas certamente uma que salta aos olhos, e combina com o que estamos discutindo, é a definição clássica de Stuart Russell e Peter Norvig, autores de “Artificial Intelligence: A Modern Approach”, de 1995. Para eles, IA é a área da ciência da computação que se dedica ao desenvolvimento de sistemas capazes de realizar tarefas que, quando realizadas por seres humanos, exigiriam inteligência. Isso inclui o aprendizado, o raciocínio, a percepção, a compreensão da linguagem e a tomada de decisões complexas.

Algoritmos se sofisticam fortemente nos dias de hoje, a partir de paradigmas de redes neurais artificiais, plataformas open source temperados por capacidade computacional mais poderosa e distribuída. Mas será que aprendizado, percepção e raciocínio podem ser confundidos com inteligência? O que os seres humanos têm que as máquinas talvez não tenham?

Gödel, Turing, Church e outros provaram, nas décadas de 1930 e 1940, que existem mais soluções por aí do que aquelas que podem ser encontradas por um procedimento genérico. Em outras palavras, uma máquina puramente algorítmica não seria capaz de encontrar soluções para certas classes de problemas.

Kurt Gödel, Alan Turing e Alonzo Church são três figuras fundamentais cujas ideias e teoremas estabeleceram bases conceituais cruciais para o desenvolvimento da ciência da computação e, por extensão, da inteligência artificial (IA).

Kurt Gödel é conhecido por seus teoremas de incompletude, que provaram que em qualquer sistema formal suficientemente poderoso, existem proposições que não podem ser provadas nem refutadas dentro do sistema. Esses teoremas têm implicações profundas na lógica, na matemática e na filosofia da mente, influenciando a compreensão dos limites dos sistemas computacionais e da própria mente humana.

Alan Turing é frequentemente chamado de “pai da ciência da computação”. Seu conceito de máquina de Turing é um modelo abstrato que define o núcleo do que é computável. Qualquer coisa que pode ser computada em um sistema pode ser computada em uma máquina de Turing. Turing também propôs o famoso teste de Turing como um critério para avaliar a capacidade de uma máquina em exibir comportamento inteligente indistinguível do de um humano, influenciando diretamente a pesquisa em IA.

Alonzo Church é conhecido por seu trabalho na lógica matemática e pela formulação do cálculo lambda, que é uma formalização de funções e aplicação que influencia as linguagens de programação funcional. O cálculo lambda e a tese de Church-Turing, que ele propôs independentemente de Turing, afirmam que tudo o que é computacionalmente possível pode ser realizado por uma máquina de Turing, estabelecendo um pilar teórico para os limites da computação.

Juntos, esses pensadores forneceram os alicerces teóricos sobre os quais se constrói a teoria da computação e a inteligência artificial. Eles ajudaram a definir o que as máquinas podem e não podem fazer, delineando assim o escopo de possibilidades e limitações dentro do campo da IA.

O que nos fascina é que nós, humanos, aparentemente conseguimos fazer isso. Será que dentro de nossos cérebros acontece algo não algorítmico que nos permite enxergar coisas impenetráveis para os computadores? E se a forma como a questão foi colocada é que é o problema?

O que Turing provou é que não existe um caminho único e puramente algorítmico para encontrar todos os algoritmos que podem existir. Mas suponha que exista uma forma simples de tentar. Uma forma disponível tanto para humanos quanto para máquinas. Não estou buscando uma maneira genérica e algorítmica de encontrar soluções. Estou apenas considerando a possibilidade de testá-las depois que forem propostas.

Ainda assim resta o problema de encontrar essas novas propostas. Essa maneira pode ser tão simples quanto uma busca aleatória. Basta tentar diferentes pontos de partida. Aumente o número de pontos de partida com base em algum conhecimento prévio e a partir daí melhore os resultados. Uma vez que um algoritmo é “escolhido”, ele pode ser facilmente testado, até mesmo para ver se ele eventualmente irá parar.

Em todas as provas da não computabilidade, sempre existe um procedimento auto referencial que faz o modo algorítmico de pensar desmoronar. Mas vamos parar de tentar encontrar um procedimento genérico e nos concentrar em uma solução específica para um problema também específico.

Com a busca aleatória para “escolher” novas soluções — soluções que hoje não estão no nosso conhecimento, mas que estão lá fora no espaço de busca, esperando para serem encontradas — e com a capacidade de testar soluções específicas, o que impediria uma máquina de ser criativa?

Tal busca na natureza chama-se Seleção Natural. Nos computadores: Aprendizado de Máquina. A Inteligência Artificial “Genérica” pode portando estar mais próxima de nós do que sequer poderíamos imaginar.

E você, caro leitor, o que “pensa” sobre isso? 😉

Foto de Por Eduardo de Rezende Francisco
Por Eduardo de Rezende Francisco

Eduardo de Rezende Francisco é casado e pai de uma jovem de 18 anos. Formado em Ciência da Computação pelo IME-USP, ele também é mestre e doutor pela FGV EAESP, mergulhado em geoanalytics e ciência de dados. Atualmente, é o chefe do Departamento de Tecnologia e Data Science na FGV EAESP, onde é também professor e pesquisador principal do FGVanalytics. Também é pesquisador visitante na University of Otago, na Nova Zelândia. Conhece bem Inteligência Artificial, Big Data, GeoAnalytics e mobilidade urbana. Foi executivo da AES Eletropaulo e consultor em microcrédito para o Itaú-Unibanco. Deu aulas e coordenou MBAs e liderou um Módulo Internacional de Big Data Analytics na ESPM. Foi membro do Conselho Curador da Fundação SEADE. É sócio-fundador do GisBI, um think tank de IA e Big Data geoespacial.

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Eduardo de Rezende Francisco é casado e pai de uma jovem de 18 anos. Formado em Ciência da Computação pelo IME-USP, ele também é mestre e doutor pela FGV EAESP, mergulhado em geoanalytics e ciência de dados. Atualmente, é o chefe do Departamento de Tecnologia e Data Science na FGV EAESP, onde é também professor e pesquisador principal do FGVanalytics. Também é pesquisador visitante na University of Otago, na Nova Zelândia. Conhece bem Inteligência Artificial, Big Data, GeoAnalytics e mobilidade urbana. Foi executivo da AES Eletropaulo e consultor em microcrédito para o Itaú-Unibanco. Deu aulas e coordenou MBAs e liderou um Módulo Internacional de Big Data Analytics na ESPM. Foi membro do Conselho Curador da Fundação SEADE. É sócio-fundador do GisBI, um think tank de IA e Big Data geoespacial.

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião da AINEWS ou de seus controladores.

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